Solilóquio
5
(1ª parte)
Sérgio de
Vasconcellos-Corrêa
01-07-2018
Em boa hora o TSE resolveu
combater as “Fake news” que infestam os meios
de comunicação tradicionais e as mídias eletrônicas espalhando informações
tendenciosas, maldosas e na maioria das vezes de reconhecível cunho ideológico.
Desta vez, não demorou para o meu outro EU meter o nariz aonde não foi chamado,
Ué! Disse ele, Você não é um dos que defendem com unhas e dentes a pureza da
língua? O que te deu para usar esse estrangeirismo, quando temos em nosso
idioma o mesmo significado com palavras nossas? Não é preferível dizer “Notícias
falsas” ao invés desse anglicismo que a grande maioria não sabe o que
significa? Desta vez tive de dar a mão à palmatória, não é que o danado me pegou
- como dizemos popularmente - com as calças na mão? Mas, voltando à vaca fria; fiquei
feliz pela decisão do STF.
Como estamos cansados de saber, o
Brasil é um País de memória curta, para não dizer sem nenhuma memória e talvez,
com essa medida, nos seja possível erradicar as inúmeras invencionices que só
servem para manchar a nossa história com mentiras que, em poucas gerações, acabam
se transformando em verdades, enxovalhando a nossa identidade cultural e o nome
do País como Nação, como, aliás, fazem hoje as nossas escolas, Falou bem, meu
chapa, Interrompeu novamente o meu alter ego, Já pensou no trabalho dos futuros
historiadores quando ao pesquisarem os fatos ocorridos nos dias de hoje, encontrarem
duas ou mais versões dos mesmos? Saberão separar o joio do trigo? A verdade,
ocultada por enganos propositais daqueles que não concordam com ela?
Estava a cismar sobre o assunto
quando me dei conta que havia acabado de ler um artigo - por sinal bem escrito
- em uma das poucas revistas dedicadas à divulgação da música erudita, na qual
encontrei exemplos gritantes do que chamo de desinformação, ou melhor,
informações incompletas, “meias verdades”, que
a resolução do TSE permitirá coibir. Isso caiu como colírio nos meus olhos.
Fiquei pensando no peso da responsabilidade colocada nos ombros do
Diretor-Editor da publicação, tida como altamente confiável, se outros leitores,
musicalmente bem preparados, atinarem para as sandices veiculadas. Com certeza
a credibilidade da revista ficará arranhada.
Começa o articulista por dizer que
a exuberância da música brasileira “pode ser explicada pela natureza
percussiva da música das etnias africanas que integraram o holocausto da
escravidão no Brasil”. De imediato
divisei duas ressalvas a serem feitas, a mais gritante refere-se à esdrúxula
afirmação: “o holocausto da escravidão no
Brasil”. Será que o responsável por
tal afirmação sabe o significado do termo “holocausto”? Tenho minhas dúvidas.
Depois, por estar inserida na mesma frase devo indagar: Só o Brasil utilizou o
trabalho escravo oriundo da África? O autor do texto sabe, por acaso, que a
abolição da escravatura, referente apenas aos africanos, se deu: na França, em
1848, na Argentina em 1853, em Portugal em 1854, na Holanda e nos Estados
Unidos em 1863, Cuba (1886), Brasil (1888), e na Alemanha (1945)? Seria
conveniente repensar e refazer o texto divulgado. Na sequência cita,
corretamente, o nome do compositor norte-americano George Antheil, como o primeiro
compositor a emancipar os instrumentos de percussão dando-lhes o papel de
formação instrumental independente (Ballet mécanique- 1924), no entanto cita como também precursores Edgard Varese (Ionisation - 1931) e
John Cage (Constructions- 1941), ignorando Dmitri Shostakovich (Interlúdio da
ópera “Les Nez”- 1928) e principalmente o
cubano Amadeo Roldán, este sim o verdadeiro autor de uma obra composta exclusivamente para
instrumentos de percussão, escrita em 1929 pelo (Rítmica V – 1929). Outra
coisa que me deixou encafifado foi a não citação do húngaro Bela Bartok, indiscutivelmente
o mais apreciado dos compositores citados, autor da estupenda Sonata para dois
pianos e percussão, datada de 1937.
Outra informação passível de levar
a escamoteação da verdade, dando a entender que a chegada ao Brasil em 1978 de “Um filho da cidade de Búfalo, na costa leste
dos Estados Unidos” foi a responsável pela prática desse tipo de
execução musical entre nós, referindo-se ao então jovem e talentoso
percussionista John Boudler, também merece reparo. Não se discute a importância
do excelente percussionista, nem tampouco à excepcional qualidade dos grupos
que formou e sim restabelecer a verdade histórica. Cinco anos antes da chegada
do jovem Boudler ao nosso País, portanto em 1973, o percussionista Claudio
Stephan, timpanista da Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal de São Paulo, já
havia criado o Grupo de Percussão do Conservatório Musical “Brooklin Paulista”,
o primeiro do gênero em São Paulo, cuja atuação se estendeu por seis anos e foi
o responsável pela primeira audição do meu concerto para piano e percussão
intitulado de POTYRON, palavra indígena que significa “trabalhando juntos com as mãos”, cuja
estreia se deu 23 de setembro de 1976 no referido
teatro, tendo como solista a pianista Clarice Faucon Stephan e o Grupo de
Percussão do Conservatório Musical “Brooklin Paulista” sob a regência do
Maestro Cláudio Stephan. Essa mesma obra foi gravada em 1978 no Álbum “Música e
Músicos de São Paulo” (LP-MIS-003-A-1978) produzido pelo Museu da Imagem e do
Som de São Paulo, interpretada por Fernando Lopes (piano) e o Grupo de Percussão
AGORA dirigido por John Boudler, depois de apresentada na “III Bienal de Música
Brasileira Contemporânea”, pelos mesmos interpretes foi gravada e lançada pela
FUNARTE (LP – 3-56-404-034 e K7
– 3-56-701-034) em 1984.
Acabo de ser atropelado pelo meu consciente dizendo que já me excedi no
número de palavras, portanto, espero que leiam a continuação na próxima semana, até lá e boa Copa.
Parabéns pelo artigo. Só hoje pude começar a ler em razão de estar terminando um reforma para mudar de casa. Abraço, Sérgio.
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